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Carta ao papai noel!


Caro Papai Noel,

A primeira coisa que quero dizer é que, não acredito no Sr.,. Por isso mesmo – se fosse apenas escrever esta carta a partir dos meus cálculos de adulta – deveria pedir que me enviasse um pouco de crença e fé – mas são tantas coisas que preciso – que melhor mesmo é escrever a carta inteira e ao final – decidir o que é melhor pedir.


O senhor vai me desculpar se lhe falo com liberdade mas nos meus tempos de criança, o senhor não era protagonista do Natal. Para nós, Natal era o Menino Jesus, Nossa Senhora, os anjos, os pastores, os reis magos... O nascimento de Jesus Cristo, Filho de Deus, nascido de Maria. Deus feito homem!

Agora - me desculpe -, o senhor entrou no meio e... botou o Menino Jesus para fora do Natal! Natal é o Papai Noel, Papai Noel é o Natal, e o Menino Jesus já era! Pensando melhor, porém, sei muito bem que a culpa não é propriamente sua. O senhor entrou nessa sem querer. Eu acredito que, se o senhor é mesmo São Nicolau, o que vai querer é que Jesus seja conhecido, amado e seguido. Acreditando nisso, quero lhe fazer um pedido, senhor São Nicolau, o verdadeiro. Ou vários pedidos. Sendo que Deus resolveu nos dar o seu próprio Filho, todo pedido é pouco...


Outra coisa que vou dizer, em casa não tem chaminé – aliás aqui em casa não tem uma porção de coisas que tinha na casa da minha infância. A única coisa que talvez continue a mesma – seja o hábito de lutar – embora antigamente lutasse por coisas diferentes como medo de escuro – hoje pela certeza do escuro das coisas que não consigo ver mais.


Então talvez fosse bom que eu pedisse coragem – afinal de contas não deve ser bom lutar a vida inteira – mas creia que se tirar de mim essa fé em vencer, vai embora o pouco que resta de humano nesta coração e sem porque. Então deixa a fé em vencer aqui.


Uma coisa importante a ser dita – talvez para mim e não para o senhor – e que hoje em dia não preciso ganhar quase nada até porque posso comprar quase tudo que quero, dentro dos meus limites financeiros. Mas ganhar é tão bom, as coisas chegam para a gente com cheirinho de quem deu e por detrás do objeto vem o carinho e por detrás do carinho pode até ter amor. Mas do que adianta tudo isso Papai Noel – eu não sei mais o que é amor – mal sei o que é trocar – e na verdade nem mesmo trocar me soa bem pois aprendi que temos que ganhar, mais e sempre mais. Então seria bom Papai Noel, que me enviasse de novo o sentido do amar – mas acho que meu coração está meio velho e assim não daria certo.


Pensando bem – Papai Noel – talvez fosse bom ter então uma família bem grande – e assim ter uma daquelas festas que vejo a distância e pelas janelas – gente rindo, se abraçando – que olhando assim de longe até parece que se amam. Mas Papai Noel – me desculpa – eu sei que o mundo não é bem assim – e entre a ilusão e a utopia – há um espaço perigoso onde moram as coisas que fazem o mundo ser como é.


Está difícil pedir alguma coisa. Talvez porque o mundo é a vida sejam de fato isso que vejo e sinto. Poderia pedir para voar – e quem sabe andando por cima do mundo encontrar um lugar de paz onde fosse possível esperar o Deus nascer. Mas em cada canto do mundo tem um conflito – alguns deles que todos podem ver – outros que se dão de maneira tão sutil que mal podemos perceber.


Papai Noel – acho que não quero pedir nada – apenas que leia minha carta para que esta imensa sensação de solidão por alguns instantes seja trocada pela sensação de que alguém entende.


Mas, pensando bem, espero que de algum jeito ou de outro, continue a entregar presentes a todo o mundo, sobretudo aos duros de coração e aos corações de criança. Para os duros de coração, o sentido da justiça e da solidariedade e da partilha. Para os corações de criança, mais sonho ainda (utopia, necessária como o pão de cada dia), a esperança sempre maior, uma ternura do tamanho de todas as estrelas de Natal juntas e muita coragem e união para lutarem pelo Tempo Novo que Jesus veio inaugurar com o seu nascimento. Ajude aos pobres e marginalizados do campo e da cidade, negros, índios e brancos, mulheres e homens, a conquistarem a terra e o pão, a casa e a dignidade, a cidadania e a festa. A todas as autoridades deste mundo, vergonha, responsabilidade e espírito de serviço.


Desculpe, Senhor Papai Noel, se pensei mal do senhor, e muito obrigado se pedi bem! Com um beijo em sua barba branca.

Atenciosamente,

Eli Amorim.

P.S: É necessário que a fé permaneça intacta, mesmo com tantas coisas ruins que vimos diariamente. Fé e consciência Sempre!!!

1 comentários:

Michele Pupo disse...

Eli

Mesmo quando criança, nunca acreditei em Papai Noel, Coelhinho da Páscoa ou qualquer outro ser criado pelo capitalismo. No entanto, creio nos bons, na coragem, nos sonhos... e a tua crônica me pareceu repleta destes elementos. Por isso, te desejo que não seja o velho de barba branca quem venha te atender,mas um Deus piedoso e misericordioso que todos os dias nos dá força para continuar vivendo.

Um grande abraço